COSTUMES
A história do povo Mbaya-Guaicuru mostra que eles foram um povo importante na manutenção do território brasileiro e na afirmação das fronteiras. As informações sobre o modo de vida deles, datadas do período de colonização estão baseadas em textos históricos e publicações acadêmicas.
A dissertação de mestrado da historiadora Ana Lúcia Herberts reconstrói os assentamentos com base em textos, relatos e fotografias. Segundo o Ana, o caráter nômade do povo se dava graças ao ambiente do pantanal: “Em períodos de seca, o grupo procurava áreas próximas a lagoas, pântanos e charcos para seus assentamentos”.

Imagem retirada da dissertação de Ana Lucia Herbets
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Em primeiro lugar é preciso entender o clima da região do pantanal mato-grossense, que oscila entre tempos de cheia e seca. Nas épocas chuvosas, o rio Paraguai transborda, estendendo suas margens. Já no inverno, ocorre a estiagem e aos poucos o rio vai se tornando mais fino, deixando para trás lagoas naturais com peixes e vegetação. As folhas das árvores mortas ficavam no solo, o que o fertilizava quando as chuvas voltavam.
O movimento dos Guaicurus acompanhava o clima. O perfil nômade é acentuado após a adesão do cavalo, mas não se restringiu à locomoção. O sustento da comunidade também era provido dos ataques às outras aldeias indígenas, portugueses e espanhóis. Logo, eles precisavam estar em constante deslocamento, sempre em busca de novos alvos.
Tal comportamento é justificado nos mitos da criação. O antropólogo Julio Cesar Melatti conta em seu livro Índios do Brasil uma história sobre a criação dos homens segundo a crença Guaicurus. Gô-noêno-hôdi, o criador, teria tirado todos os povos de dentro de um buraco e dado características a cada um deles. Mas ele esqueceu dos Guaicurus que por esta razão nasceram sem um dom. Então eles deveriam caminhar pelo mundo e pegar um pouco de cada cultura para si.
ORGANIZAÇÃO SOCIAL
Eles possuíam um modelo social estruturado tinha camadas. A mais alta era a dos Capitães e era transmitida para descendentes, porém homens e mulheres de camadas abaixo poderiam ascender por feitos em batalha. Haviam os Guerreiros, que não gozavam do prestígio do topo da sociedade, mas que ainda tinham privilégios.
Por último, ficavam os Cativos. A classe equivale aos escravos, mas com algumas diferenças ao modelo que conhecemos. O povo Guaicurus acreditava que o trabalho de plantio e colheita era indigno para um guerreiro, logo a função ficava a cargo aos subalternos. Mas eles poderiam crescer dentro da sociedade, por meio do mérito ou casamento.
A VIDA: ASSENTAMENTOS, SUBSISTÊNCIA E FERRAMENTAS
O comportamento nômade começa a mudar no século XIX, já identificados como Kadiwéu. Ana Lúcia Herberts traz em sua dissertação informações sobre esses acampamentos. Cabe ressaltar que todo trabalho da autora é documental, coletando e compilando informações obtidas ao longo dos séculos. Ela cita Guido Boggiani, etnólogo que teve contato com os indígenas para descrever a morada.
“A aldeia era constituída de um espaço limpo em frente das casas, a praça. Este espaço era utilizado coletivamente para atividades sociais, como festas, jogos, cerimônias e lutas”. Essa descrição é diferente das que eram dadas pelos colonizadores do século XVI, quando o povo ainda apresentava o forte traço nômade.
A caça, a pesca e a coleta eram as principais formas de subsistência. As peles eram aproveitadas para construir agasalhos ou comercializar com os outros habitantes da região. Algumas peles, como a da onça pintada, tinham significado místico e eram conservadas dentro do grupo. Todo tipo de recurso natural, como folhas, frutas era aproveitado no dia a dia, mas não cultivavam em grande quantidade.
Eles conseguiam itens como mandioca e milho por meio de trocas ou do sistema de vassalagem introduzido em outras tribos. O pouco cultivo era realizado pelos cativos, visto que os capitães e guerreiros não realizavam a tarefa. Também domesticaram animais trazidos pelos colonizadores europeus.
O maior destaque desse processo pertence ao cavalo. Como mencionado, o uso de montaria ampliou a influência e o poder de atuação deles na região, mas não foi o único animal que eles incorporaram sua sociedade.
Quando os europeus iniciaram o processo de colonização, eles criavam animais como ovelhas, gado e porcos. Alguns desses animais foram parar na natureza, em um processo semelhante ao ocorrido com os cavalos, o povo Mbaya-Guaicuru os domesticou.
Mas não foram somente os animais que eles importaram de outras culturas. Diversas ferramentas foram adquiridas ao longo do tempo e do contato com diferentes culturas por toda a região do Pantanal. A prática durou por anos, até o século XIX quando o povo Kadiweu chegou a possuir armas de fogo.
Arte baseada na dissertação de mestrado "OS MBAYÁ-GUAICURÚ: área, assentamento,
subsistência e cultura material", de Ana Lúcia Herberts
